A ‘Semana do Brasil’ e o dever cívico de acreditar

Em Cândido ou O Otimismo, Voltaire nos estimula a refletir sobre a linha que divide o otimismo da ingenuidade. Os diálogos entre o mestre Pangloss, para quem tudo acontece de melhor no melhor dos mundos possíveis, e Cândido, o protagonista que passa por diversos sacrifícios, dão as pistas para demarcação da fronteira. Ser otimista é ser um viajante com visto legalizado para ingenuidade. E que bom sê-lo com convicção.

Especialmente quando se está em jogo o presente de uma nação. É assim que pode-se, e deve-se, encarar a Semana do Brasil. Essa tentativa do Governo Federal em gerar uma onda nacional de compra e consumo neste mês de setembro. Apostemos nela como se fôssemos todos discípulos de Pangloss, na torcida que ela seja o melhor no melhor dos mundos possíveis.

Longe das posições políticas de cada um, qualquer pessoa que torcer o nariz por antecipação à Semana do Brasil estará fazendo por motivações outras que não a de um brasileiro comum que gostaria de ver a economia voltar a dar sinais de prosperidade, com geração de emprego, melhoria da renda, e retomada dos investimentos nos diversos serviços públicos e privados. Por mais vermelho de raiva que você esteja, não é um bom mundo este?

Tudo bem que houve a inclusão de uma pitada de patriotismo típico do ambiente que ajudou a eleger o ‘Mito’ em 2018. E, para ser uma Semana do Brasil num Governo Bolsonaro, óbvio que deveria ser na data mais militarizada do País, o 7 de setembro, quando saem do armário os mais amarrotados casacos militares e as mais enferrujadas comendas de metal, para ganhar as ruas e os desfiles.

Mas focar na política e esquecer a economia é adotar uma visão estreita. Digna de quem ainda está na disputa eleitoral. E não num país que precisa de oportunidade de emprego para sua gente.

Claro que para dar certo, além de uma boa dose de otimismo, é preciso que algumas tarefas básicas sejam cumpridas. Uma boa divulgação midiática e, especialmente, uma adesão empresarial que assegure, efetivamente, promoções, preços baixos, descontos, facilidades de pagamento, são imprescindíveis. Falhando aí, o fiasco desestimulará até o mais aplicado dos discípulos de Pangloss.

Atingir tais requisitos, entretanto, por si só, não são garantia de sucesso. ´É preciso saber se, mesmo com isso, os brasileiros estarão dispostos a gastar entre o dia 6 e 15 de setembro. Num clima de timidez exagerada da economia, apesar do fio de cabelo de crescimento do PIB e do avanço da geração de empregos formais,  pode ser que ninguém se sinta tão estimulado a gastar.

Por ora, a preço de hoje, estamos mais para pensar que o Natal vem aí e é melhor não gastar antecipado do que em empurra o pé nas compras. Não da para comprar agora e não comprar nada depois. A Semana do Brasil não quer que você escolha. Quer que você multiplique. Neste sentido, é na disposição do empresariado que poderemos encontrar a chave para destravar esta fechadura mental que impede o fluxo consumistas de nós brasileiros, gastadores compulsivos. Sim, um presidente com frases de impacto e faces de estímulo para sensibilizar o consumo também ajudaria.

Mas será na margem de preço que as coisas (poderão) acontecer. Apesar de todos estes ‘poréns’, porém, é preciso exercitar o otimismo e juntar-se à crença de que tem que dar certo. Não precisa vestir verde e amarelo, içar uma bandeira na frente de casa e cantar o Hino Nacional. Isso não melhorará a economia. No máximo, vai esquentar o

mercado têxtil. É preciso unir-se e apostar que um bom movimento ou um movimento razoável é capaz de impulsionar-nos para a casa do 1% de crescimento, embora os economistas mais pessimistas não creiam.  Eu vou fazer a minha parte. Vou torcer que dê certo. Vou cuidar do meu jardim. E, se encontrar uma boa promoção mesmo, adquirir aquilo que estava pensando em comprar somente em 2020. Meu otimismo, ou minha ingenuidade, tem que servir para alguma coisa. Que seja para cumprir um dever cívico.

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