Vacina contra abuso no lugar de quarentena contra democracia

Sejamos diretos. É provável que, se pudessem, congressistas aprovariam uma legislação pela qual só poderiam disputar as eleições aqueles que já estão com mandato, somente se abrindo vagas para em caso de morte ou incapacidade física e mental de exercício do atual mandatário.

Como não podem, trabalham em medidas sutis que restringem a participação no jogo para além daqueles que são os atuais donos da bola.

A tal quarentena para juízes, promotores, procuradores, policiais e membros das Forças Armadas que desejarem disputar uma eleição é uma dessas violentas sutilezas.

Forçar o afastamento quatro anos antes de cada processo desejado é praticamente matar na fonte o desejo da disputa. E diminuir a amplitude imposta na expressão democracia representativa.

A medida, empurrada na reforma do Código Eleitoral, e já aprovada pela Câmara dos Deputados, pendente ainda da avaliação do Senado Federal, nasce sob pretexto de quem esses integrantes se utilizam de suas prerrogativas funcionais para, de alguma forma, se beneficiar com respectivas eleições, especialmente com atitudes que prejudicam a vida de potenciais concorrentes, exercendo abusos de poder.

A alegação, de fato, encontra relativa lógica diante de alguns casos já expostos. Mas não pode ser tratado de forma genérica nem muito menos com um antídoto que é mais violento e amplo que o próprio veneno.

No caso da autopromoção, o combate atingiria uma infinidade de outras categorias. Uma vez que cada uma traz, ao seu modo, benefícios específicos. Artistas, por exemplo, partem na frente numa eleição porque são famosos e conhecidos. E os médicos? Jornalistas? Empresários? Padres? Pastores? E políticos com mandato autorizados à reeleição? Cada qual com uma capacidade de ampliação do poder de voto superior a de um “cidadão comum”.

Estariam todos obrigados a interromperem suas atividades quatro anos antes de uma eleição?

Porque a regra valeria apenas para juízes, promotores e policiais?

Bem ou mal, a legislação eleitoral em vigor já impõe uma restrição para reduzir impacto que suponha uma quebra da isonomia. E até pode ser aprimorada, mas não na lógica de matar a participação.

O argumento, no entanto, tem recaído mais no mal que cada um desses integrantes do Poder Judiciário e das forças de segurança pode fazer a um eventual adversário político. Algo que, como já dissemos, pode sim acontecer. Mas a medida teria que combater a exceção e não a regra.

Como combustível simbólico para o debate, usa-se comumente o caso do ex-juiz Sérgio Moro. Que condenou o ex-presidente Lula à prisão e, na sequência, virou ministro da Justiça do presidente eleito beneficiado, direta ou indiretamente, com a exclusão do petista do páreo.

De fato, de alguma forma, e mesmo que apenas simbolicamente, Moro reduziu o grau de imparcialidade de suas decisões anteriores a aceitar fazer parte e se beneficiar com cargo de ministro do candidato vitorioso contra o projeto de seu sentenciado.

Mesmo levando em conta que Moro não foi candidato nas eleições de 2018, é preciso registrar que a decisão dele sozinha não teria impacto proibitivo no projeto político de Lula não fosse a decisão colegiada em segunda instância confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Ou seja, a quarentena de nada teria valido, visto que os desembargadores do TRF não tinham pretensão nem foram candidatos.

Pode-se dizer que, para além de decisões prejudiciais e proibitivas, os membros do Poder Judiciário podem macular deliberadamente a imagem de um pretenso candidato e, portanto, se beneficiar com isso. Também é verdade. Mas é importante lembrar que o Poder Legislativo, mesmo sendo função atípica, também tem prerrogativas do Poder Judiciário, vide o papel das CPIs. Isolar, portanto, tais atitudes para combatê-las pode parecer o caminho mais difícil, porém é o mais isonômico.

 

Impor, por exemplo, que tais integrantes que desejarem ser candidatos não possam ter decisões adversas de conselhos, corregedorias, ou até mesmo judiciais, em razão de eventuais recentes abusos cometidos no exercício da função poderia ser algo mais restritivo. Outras medidas deste gênero podem ser aprimoradas.

Muito mais eficiente é reforçar cada vez mais mecanismos que impeçam membros do Judiciário de eventualmente cometerem injustiças inspiradas sob qualquer natureza e pretexto.

Se há necessidade de correção que se procure fazer no exercício do poder de julgador ou de polícia judiciária e não no exercício de participação democrática.

 

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